Deputados analisam o que foi apurado e o que vem pela frente

© Marcelo Camargo/Agência Brasil

 

Comissão investiga os atos do dia 12 de dezembro e 8 de janeiro

 

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Antidemocráticos encerrou o primeiro semestre de 2023 com 168 requerimentos analisados, 18 reuniões ordinárias realizadas e 16 depoimentos colhidos. Foram ouvidos ex-ministros, ex-secretários de Estado, generais, comandantes da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) e membros de alto escalão das forças de segurança, além de empresários e até mesmo aqueles já condenados pela tentativa de bomba em área do Aeroporto Internacional de Brasília.

Destaques

Entre os destaques deste primeiro semestre, segundo avaliação do presidente do colegiado, deputado Chico Vigilante (PT), estão os depoimentos de generais, fato marcante na história da CLDF. “Um ponto importante que deve ser ressaltado aqui foi o depoimento de três generais. Pela primeira vez, a gente trouxe general da ativa para depor em uma CPI de caráter regional. Portanto, esse é um momento que considero como ponto alto dessa CPI”, afirmou Vigilante.

Por sua vez, o relator da comissão, deputado Hermeto (MDB), enxerga como destaque os depoimentos de membros do alto escalão da PMDF. O distrital cita como exemplos as oitivas do comandante-geral da corporação, coronel Klepter Rosa, e do coronel Naime, ex-comandante do Departamento de Operações. “Posso destacar os depoimentos do coronel Naime, que veio dizer o que acontecia naqueles acampamentos. O depoimento do coronel Klepter foi muito preciso porque queriam dizer que ele tinha colocado a tropa de sobreaviso e não de prontidão. E ele conseguiu explicar claramente que aquilo é um hábito na corporação. A opção de ele ter colocado de sobreaviso foi [decorrente] das informações que ele tinha através do serviço de informação”, disse Hermeto.

Já na opinião do deputado Pastor Daniel de Castro (PP) ainda não houve um depoimento capaz de alterar os rumos da investigação. “Até agora a CPI não tem nenhum depoimento bombástico que pudesse trazer a previsão de criminalização de alguém. A CPI está norteando. A gente está investigando ainda e espero que a gente consiga chegar à verdade real e assim culpar os verdadeiros culpados e inocentar aqueles que estão presos injustamente”, declarou Daniel de Castro, que é membro efetivo da comissão desde o início dos trabalhos.

Para o deputado Fábio Felix (Psol), também membro efetivo do colegiado desde o início das atividades, a CPI tem funcionado muito bem e há oitivas que merecem destaque. “Acho que tem dois depoimentos marcantes da polícia militar, que são o do coronel Fábio [Augusto, ex-comandante-geral da PMDF, que ocupava o cargo no dia 8 de janeiro], que falou muito sobre os procedimentos adotados, sobre a falta de relatório de inteligência e sobre o não cumprimento operacional. E também o do coronel Naime, que trouxe vários elementos sobre a atividade criminosa no próprio Quartel General [do Exército]. E, infelizmente, negativamente, acho que os depoimentos dos generais, que não quiseram falar o que deveriam falar sobre a atividade criminosa no quartel e não conseguiram explicar por que o exército brasileiro não combateu a atividade golpista criminosa em frente ao quartel general, que a gente sabe que foram as ações preparatórias para os atos do dia 8”, asseverou o parlamentar.

Relação com o STF

A CPI dos Atos Antidemocráticos também alcançou relação de boa colaboração com o Supremo Tribunal Federal (STF) por meio do gabinete do ministro Alexandre de Moraes. Neste aspecto, também há interpretações distintas entre os parlamentares.

Para Vigilante, desde o momento em que os membros da comissão foram recebidos pelo ministro houve boa relação e resultados interessantes alcançados. “Ele estava com todo o staff dele postado na porta, aguardando os integrantes da CPI. Depois nós tivemos uma conversa muito proveitosa. Nós propusemos que existisse uma integração, um compartilhamento que já foi feito [pelo] Supremo com a CPI. A gente tinha também a necessidade de autorização do ministro [Alexandre de Moraes] para que a gente ouvisse pessoas que estavam presas, inclusive o ex-ministro Anderson Torres, que não veio porque não quis. Mas o ministro [Alexandre] autorizou a vinda dele”, contou o presidente da CPI.

Por outro lado, para Hermeto a colaboração foi boa, mas poderia ter sido ainda mais profícua. “O ministro poderia compartilhar com a gente informações que estão sigilosas ainda lá. A gente tem que entender por que o coronel Naime ainda está preso. Essa é a grande pergunta que eu quero fazer. Por que ele está preso ainda? Ele tem residência fixa, não pode atrapalhar a Justiça. Ele tem diversas contribuições que poderiam relaxar uma prisão preventiva. Essa informação nós não sabemos. Será que o ministro Alexandre de Moraes sabe alguma coisa que nós não sabemos ainda? Será que o que está sendo mantido em sigilo pelo ministro Alexandre de Moraes, a CPI não sabe? O conteúdo da quebra de sigilo telefônico, de mensagem ou alguma outra coisa parecida que o ministro sabe e nós não sabemos porque já foi solto todo mundo praticamente. Por que só o coronel Naime está preso? Essa é uma pergunta que eu faço”, questionou o relator da CPI.

O que já foi apurado

Dentre as centenas de requerimentos aprovados, há pedidos de informações destinados a diversos órgãos como Câmara dos Deputados, Senado Federal, STF, Ministério da Justiça, Abin e PMDF, por exemplo. Toda essa extensa documentação está sendo analisada pelos membros da comissão, auxiliados pela equipe técnica que assessora o colegiado. Os parlamentares também avaliaram o que foi apurado neste primeiro semestre de 2023.

Para o relator, o trabalho está sendo feito de maneira séria e já tem um norte definido. “Uma CPI séria, que está se aprofundando. Posso dizer que meu relatório será extremamente preciso e imparcial. E, acima de tudo, buscando elucidar realmente o que aconteceu no dia 8”, disse Hermeto. Em outro momento, o deputado adiantou que já pode perceber melhor o que ocorreu.

“Ninguém estava esperando aqueles atos do dia 8. A polícia militar vinha preparada há muito tempo, desde 7 de setembro, da diplomação do presidente até a posse do presidente. Todos os mecanismos de segurança pública foram utilizados. A tropa vinha há muito tempo sendo utilizada. A tropa vinha cansada, posso dizer isso”, declarou o relator.

Em outro momento, Hermeto acaba adiantando alguns aspectos que devem constar do seu relatório. “Realmente houve um erro gravíssimo de planejamento por parte ou da Secretaria de Segurança ou dos órgãos de informações, mas que houve. Não aquela tropa que estava empenhada no dia 8. Aquilo ali não tem culpa nenhuma, foi pega de surpresa. Mas, aqueles que tinham que fazer o planejamento é que serão responsabilizados”, falou o relator.

Ele também alegou que houve falhas no Governo Federal. “O general G. Dias, que era chefe do GSI, disse que manteve todo o grupo dele [com pessoas] do governo passado. Manteve até o secretário-executivo. Isso é uma falha grave. A gente vinha de uma eleição muito polarizada. Teve a transição. Jamais poderia ter mantido pessoas que vinham do outro governo. Acho que isso é normal. Tinha que ter mudado”, afirmou Hermeto.

Fábio Felix manifestou seu ponto de vista. “Já foi possível apurar que houve erro grave da PMDF. Especialmente, erro operacional porque existia uma previsão e um planejamento que não foi cumprido”, disse o deputado. Ele afirma ainda que outras questões são importantes. “Também é possível dizer que houve orientação da Polícia Federal para que não se abrisse a Esplanada e a PMDF preferiu que estivesse aberta. E a falta e ausência dos comandantes dos batalhões operacionais, a demora [deles], o sobreaviso, que também ocasionou na demora, e não a prontidão. São alguns erros operacionais que são percebidos. Do outro lado, no exército, um erro foi a falta de enfrentamento e combate à atividade criminosa no quartel general”, afirmou Félix.

Já o deputado Pastor Daniel de Castro aborda outros aspectos. “Eu imagino que até agora [o que foi apurado] é a omissão de agentes públicos que tinham o dever de ter protegido a sede dos três poderes e assim não procederam. Então, essas pessoas também estão tendo as suas condutas investigadas e no final eu sei que nós teremos um relatório que irá alcançar essas pessoas. Esperamos que [essa CPI] encontre a verdade real. Não vamos ficar sentados em narrativas. A gente sabe que esses atos tiveram a participação, omissão ou leniência de todos os lados e é isso que buscamos”, disse Daniel de Castro.

 

O presidente da CPI registra o trabalho técnico dos servidores e diz que já há muita informação. “Temos servidores aqui da Câmara Legislativa, inclusive um procurador que estão analisando [as informações]. Eu creio que a gente já tem documento com muita substância para que o relator, deputado Hermeto, faça um excelente relatório para que a gente possa individualizar as condutas e apontar os responsáveis para o Ministério Público oferecer a denúncia e que depois o Poder Judiciário venha a condená-los”, declarou Chico Vigilante.

O que vem pela frente

Embora a CPI tenha registrado avanços, há ainda muitos caminhos a percorrer. Por exemplo, Chico Vigilante já adianta que vai propor a realização de duas sessões semanalmente para o segundo semestre. “Vamos continuar no mesmo ritmo. Eu até vou propor que a gente possa fazer duas sessões por semana ao invés de uma. Nós estamos tendo um bom relacionamento com a CPMI [Comissão Parlamentar Mista de Inquérito] Nacional, inclusive estamos disponibilizando todo o material já apurado por nós aqui. Portanto, a gente espera que no segundo semestre ela [a CPI] continue produzindo bem. Hoje a CPI é uma referência nacional, inclusive já é notícia internacional”, diz o presidente do colegiado.

A cooperação com a CPMI, a comissão do Congresso Nacional, é uma tônica praticamente geral. A expectativa do deputado Pastor Daniel de Castro é intensificar essa comunicação. “Uma coisa que eu espero é que a gente possa prorrogar um pouco mais essa CPI para comunicá-la com a CPMI porque o braço [dela] é mais longo do que o nosso da CPI. Seguramente, eles vão em agentes que a gente não pode ir, até da esfera do governo federal, que para mim já está demonstrada a omissão de alguns membros. Aí, nós podemos comunicar nossa CPI com a CPMI e produzir um grande relatório”, disse o deputado.

Daniel de Castro afirmou também que espera outros avanços no segundo semestre. “Chegou aqui na Câmara Legislativa a relação daqueles que estavam hospedados nos hotéis e nós vamos buscar essas pessoas, intimá-las para que possam depor. Vamos pedir quebra de sigilo fiscal, bancário e telefônico dessas pessoas para saber quem financiou. Então entendo que a gente tem muito trabalho pela frente”, declarou o pastor.

O deputado Hermeto também falou sobre a cooperação entre a CPI da CLDF e a CPMI. “A nossa CPI já foi procurada pela CPI nacional para que a gente possa ajudá-los no que tange ao compartilhamento de informações. E a gente percebe que a CPI nacional é séria. Mas o que passa para a gente em alguns momentos é que está uma guerra ideológica e aqui, na CPI do DF, não tem isso. Nós realmente queremos elucidar os fatos”, afirmou o relator.

Por fim, o deputado Fábio Felix ressaltou a importância de depoimentos que estão previstos para o mês de agosto. Há oitivas bastante aguardadas. Por exemplo, a do ex-ministro Anderson Torres e do tenente-coronel do exército, Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. “A partir de agosto a gente começa uma série de oitivas decisivas. Entre elas o Mauro Cid e também um major da polícia militar que tem sido acusado de treinar pessoas no acampamento do exército. Então muita gente ainda vai ser ouvida. E algumas pessoas serão ouvidas novamente, como coronéis ou comandantes que falaram para a CPI, mas muitas dúvidas ainda restaram sobre os seus depoimentos e muita análise documental. Então tem muita coisa para acontecer no segundo semestre”, garantiu o distrital.

Vanguarda

Chico Vigilante e Hermeto ainda falaram sobre a iniciativa da CLDF em criar e instalar a CPI, tão logo ocorreram os atos do dia 8 de janeiro, mesmo durante o recesso parlamentar.

“Na verdade, quando aconteceu o 8 de janeiro de 2023, a Câmara Legislativa estava de recesso. Nós propusemos ao deputado Wellington, que é o presidente aqui da Câmara Legislativa, que fizesse uma reunião extraordinária. Fizemos a discussão da gravidade daqueles fatos acontecidos e, a partir daí, partimos para a criação da CPI. Inicialmente, tinha um pedido nosso, da bancada do PT, e um pedido da bancada do PSOL. Mais uma vez conversei com o deputado Wellington. Chegamos à conclusão que era importante que fosse uma CPI do conjunto da Câmara Legislativa. E aí tivemos assinatura de 23 deputados pela instalação da CPI”, relembrou o presidente da comissão.

O relator afirma que a iniciativa foi um passo de vanguarda. “A Câmara Legislativa deu um passo grande, na frente de todos para que a gente possa dizer o que aconteceu naquele dia 8 de janeiro. A comissão foi bem escolhida com o presidente sendo de esquerda, um ícone aqui em Brasília dos movimentos. E eu como relator, oriundo da polícia militar, de direita, da base do governo Ibaneis e contrabalanceando todos os membros CPI”, disse Hermeto.

 

Por Francisco Espínola – Agência CLDF