Precarização do trabalho atinge quase um terço da força de trabalho no Brasil, segundo IBGE

© Paulo Pinto/Agência Brasil

 

Quase um terço dos trabalhadores brasileiros está em situação de informalidade, atuando sem carteira assinada ou sem registro de pessoa jurídica (CNPJ). Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que, no primeiro trimestre de 2025, 32,5 milhões de brasileiros estavam nessa condição — o equivalente a 31,7% dos 102,5 milhões de ocupados no país.

O levantamento não inclui outros segmentos igualmente expostos à precarização, como os 4,3 milhões de trabalhadores domésticos sem carteira, os 2,8 milhões no setor público também sem vínculo formal e os 816 mil empregadores que atuam sem CNPJ.

Em comparação com o mesmo período de 2024, houve aumento tanto em números absolutos quanto em termos proporcionais. Naquele momento, os informais e os sem carteira assinada no setor privado somavam 32,3 milhões de pessoas (31,5%). Em cinco anos, o crescimento foi de quase 10% — em 2020, eram 29,7 milhões.

A crescente informalidade é vista por especialistas e entidades sindicais como reflexo da deterioração das relações de trabalho no país. O tema ganhou destaque na “Pauta da Classe Trabalhadora 2025”, entregue por oito centrais sindicais ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesta terça-feira (29). Entre os principais pontos está o combate ao subemprego, à terceirização, ao trabalho intermitente e à chamada “plataformização” — modelo baseado em aplicativos que terceiriza serviços e dispensa vínculos empregatícios.

No Dia do Trabalhador, comemorado nesta quinta-feira (1º), manifestações foram realizadas em São Paulo para denunciar a precarização e a exploração praticada por empresas de aplicativo.

Segundo o IBGE, 19,1 milhões de trabalhadores atuam por conta própria sem CNPJ, o que representa quase um quinto da população ocupada. Para obter uma renda próxima à de um empregado formal, muitos acabam trabalhando jornadas exaustivas. “A maioria dos entregadores precisa trabalhar 14 ou 16 horas por dia para ganhar o mesmo que um CLT faz em oito”, afirma Gilberto Almeida, presidente da Federação Brasileira dos Motociclistas Profissionais (Febramoto).

O contraste entre rendimentos também é expressivo: trabalhadores com carteira assinada recebem, em média, R$ 3.145 por mês — 51% a mais que os R$ 2.084 pagos aos autônomos informais.

De acordo com o pesquisador do Ipea, Sandro Sacchet de Carvalho, a chegada dos aplicativos acentuou um processo já em curso desde os anos 1990: a institucionalização de formas precárias de trabalho. “A plataformização do trabalho representou uma queda de renda, mais horas trabalhadas e menos contribuição previdenciária”, observa.

As empresas, no entanto, têm uma visão diferente. A Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec), que reúne grandes plataformas como iFood, afirma que essa nova modalidade de trabalho oferece liberdade e flexibilidade, e defende uma regulamentação que respeite o modelo. “Os profissionais parceiros prestam serviços de forma autônoma. É urgente garantir que tenham acesso a benefícios previdenciários como auxílio-doença e aposentadoria”, diz André Porto, diretor-executivo da entidade.

O iFood, por sua vez, afirma que o trabalho via app é, para muitos, uma fonte de renda complementar. Segundo pesquisa Cebrap/Amobitec de 2022, 48% dos entregadores também tinham outra ocupação — metade deles com carteira assinada. A empresa ressalta que os entregadores têm autonomia sobre suas jornadas e podem recusar entregas ou trabalhar para concorrentes.

Outra face da precarização é a “pejotização” — quando trabalhadores são contratados como pessoa jurídica para burlar a exigência de vínculo empregatício. O IBGE estima que 6,8 milhões atuam como PJ no país. Para profissionais altamente qualificados, essa modalidade pode ser vantajosa. No entanto, segundo Carvalho, a prática tem sido usada por empresas para reduzir custos, resultando em perda de direitos e insegurança jurídica.

“A maioria da pejotização representa uma perda de direitos. O trabalhador fica mais exposto a demissões, sem indenizações ou seguro-desemprego”, afirma. Ele lembra que a reforma trabalhista de 2017 facilitou esse tipo de contratação. A prática está atualmente sob análise do Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu processos sobre o tema até uma decisão definitiva.

A “Pauta da Classe Trabalhadora 2025” reúne 25 reivindicações. Além da regulamentação das atividades por aplicativo e combate à informalidade, o documento defende a valorização do salário mínimo, a recuperação do poder de compra de aposentados e pensionistas, o fortalecimento do FAT e do FGTS, a redução da jornada de trabalho sem corte de salários e o fim da escala 6×1.

Apesar do alto índice de informalidade, o número de trabalhadores com carteira assinada no setor privado atingiu um recorde histórico, com 39,4 milhões de empregados no primeiro trimestre — maior patamar desde o início da série histórica da Pnad Contínua, em 2012.

Em seu perfil no Instagram, o presidente Lula destacou o recebimento da pauta das centrais sindicais. “Nosso governo tem raízes nessa luta e estará sempre com as portas abertas para o diálogo com aqueles que fazem a roda da economia girar”, afirmou.