Bolsonaro vira réu mas nega articulação de golpe de Estado

© Lula Marques/Agência Brasil

Ex-presidente afirma que não convocou conselhos para decretar Estado de Defesa e se diz perseguido politicamente

Logo após ser tornado réu pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito, o ex-presidente Jair Bolsonaro tentou se defender publicamente nesta quarta-feira (26). Em um discurso de 50 minutos em frente ao Senado, em Brasília, ele negou que tenha articulado um plano para suspender as eleições de 2022 com os comandantes das Forças Armadas, como aponta a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR).

“Antes de uma hipotética assinatura de um decreto de Estado de Defesa, como está no artigo 136 da Constituição, o presidente da República tem que convocar os conselhos da República e da Defesa. Não convoquei os conselhos, nem atos preparatórios houve para isso”, disse Bolsonaro.

O ex-presidente evitou responder a perguntas dos jornalistas e estava acompanhado de aliados do parlamento. Durante sua fala, ele voltou a sugerir, sem apresentar provas, que as urnas eletrônicas não são seguras, atacou o ministro do STF Alexandre de Moraes e se declarou vítima de perseguição política.

Acusações e defesa

A denúncia da PGR sustenta que Bolsonaro se reuniu com os comandantes do Exército, da Aeronáutica e da Marinha no dia 7 de dezembro de 2022, no Palácio da Alvorada, para discutir a chamada “minuta do golpe”. O documento previa a suspensão das eleições e a permanência de Bolsonaro no poder, o que caracterizaria uma ruptura democrática.

Ainda segundo a acusação, o então comandante da Marinha, Almir Garnier, teria aceitado a proposta, enquanto os demais chefes militares a rejeitaram. Além disso, a PGR afirma que Bolsonaro já tinha um discurso pronto para anunciar o golpe, encontrado posteriormente em sua sala na sede do Partido Liberal (PL).

Ao comentar a decisão do STF, o ex-presidente argumentou que os militares jamais embarcariam em uma “aventura” golpista. Ele também afirmou que discutir hipóteses de dispositivos constitucionais, como o Estado de Sítio ou o Estado de Defesa, “não é crime”.

“Discutir hipóteses de dispositivos constitucionais não é crime”, afirmou.

Neste momento, um jornalista perguntou: “Então o senhor discutiu [sobre o decreto]?”. Bolsonaro ficou em silêncio por alguns segundos, encarou o repórter e respondeu de forma ríspida:

“Acho que a maioria já aprendeu aqui como é que eu ajo. Se quiser tumultuar com você, vamos embora.”

Durante seu governo, era comum que Bolsonaro atacasse jornalistas em coletivas de imprensa, evitando responder diretamente a questões sensíveis.

Discurso de perseguição e críticas à democracia

Bolsonaro voltou a alegar que é alvo de perseguição política e que sua condenação faz parte de um suposto plano para impedi-lo de disputar novas eleições. Ele já está inelegível até 2031, mas, em uma rede social, afirmou que querem condená-lo rapidamente para impedir sua participação no pleito de 2026.

“A comunidade internacional acompanha de perto o que está acontecendo no Brasil. Juristas, diplomatas e lideranças políticas já reconhecem o padrão: é o mesmo roteiro que se viu na Nicarágua e na Venezuela”, escreveu.

Especialistas ouvidos pela imprensa contestam essa tese e avaliam que a estratégia de Bolsonaro busca deslegitimar as investigações e evitar que seus apoiadores sejam responsabilizados. O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), rebateu a alegação e defendeu que o Brasil segue sendo uma democracia plena, sem perseguições políticas ou censuras.

Com a decisão do STF, Bolsonaro agora responderá formalmente como réu no processo, que seguirá para a fase de instrução penal.