
Insetos contaminados com Trypanosoma cruzi foram encontrados em laboratório de pesquisa e outras áreas do bairro
A Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC) denunciou que dois barbeiros contaminados com o protozoário Trypanosoma cruzi, causador da Doença de Chagas, foram encontrados no Pavilhão Lemos Monteiro, um prédio centenário do Instituto Butantã utilizado para pesquisas. Os insetos foram capturados em outubro e novembro de 2024, e a preocupação aumentou após relatos de mais dez barbeiros localizados em outras áreas do instituto, sendo que dois também estavam infectados.
O alerta se estende ao Campus Butantã da USP, onde circulam cerca de 70 mil pessoas diariamente. No final de 2024, pelo menos seis barbeiros foram identificados na universidade, reforçando o risco de contaminação na região.
Impacto ambiental e proliferação do vetor
Pesquisadores apontam que a expansão do Instituto Butantã e a intensa verticalização do bairro têm alterado o habitat natural dos saruês, mamíferos que servem como reservatórios do Trypanosoma cruzi. Essas mudanças no ambiente favorecem o contato dos barbeiros com seres humanos.
“Se nenhuma atitude for tomada pela Secretaria da Saúde para alertar a população e reestruturar as atividades da Superintendência de Controle de Endemias (Sucen), pode haver infecções em seres humanos, se é que já não estão ocorrendo”, alertou Helena Dutra Lutgens, presidente da APqC.
A Sucen foi extinta em 2020, e suas funções foram redistribuídas para órgãos estaduais e municipais. No entanto, especialistas alegam que a nova estrutura compromete o monitoramento e o treinamento das equipes de saúde.
Segundo registros da Revista Fapesp, entre 2014 e 2019, mais de uma centena de barbeiros foram catalogados na região pela Sucen. Com o fechamento do órgão, não há informações sobre se insetos infectados entraram em contato com humanos, o que dificultaria a detecção de possíveis infecções.
Respostas das autoridades
A Secretaria Estadual da Saúde afirmou que monitora a circulação do Trypanosoma cruzi na Grande São Paulo desde 2019 e que não há registros de infecção humana na capital. O órgão destacou que agentes de saúde municipais são capacitados para identificar o inseto e realizar exames para detectar a presença do parasita.
Já o Instituto Butantã informou que o caso foi isolado e segue sendo monitorado por equipes técnicas. A Secretaria Municipal da Saúde também garantiu que a vigilância epidemiológica acompanha a presença dos triatomíneos, principalmente da espécie Panstrongylus megistus, que ocorre naturalmente em áreas florestais.
Além da região do Butantã, a APqC identificou o Zoológico Municipal como outra área propensa à infestação de barbeiros. A concessionária responsável pela gestão do parque afirmou que segue protocolos de monitoramento e não recebeu notificações de casos positivos para Trypanosoma cruzi no segundo semestre de 2024.
A ameaça da Doença de Chagas
A Doença de Chagas é considerada negligenciada, por não ser prioridade no desenvolvimento de tratamentos e métodos preventivos. O Ministério da Saúde explica que a infecção tem uma fase aguda, que pode ser sintomática ou assintomática, e uma fase crônica, que pode afetar o coração e o sistema digestivo.
Os sintomas iniciais incluem febre prolongada, dor de cabeça, fraqueza intensa e inchaço no rosto e pernas. A doença é endêmica na América Latina, com Brasil e Argentina registrando cerca de 2 milhões de casos cada. Contudo, a subnotificação é alta, com estimativas indicando que até 90% dos infectados desconhecem a própria condição.
A maior parte dos casos decorre da ingestão de alimentos contaminados pelas fezes do barbeiro. Diante do avanço dos insetos para áreas urbanas, pesquisadores alertam para a necessidade de um monitoramento mais rigoroso e campanhas de conscientização para evitar novos casos da doença.