8 de Janeiro: Psicanalistas analisam seu impacto social

© Marcelo Camargo/Agência Brasil

 

Especialistas apontam razões psicológicas e sociais para a invasão à Praça dos Três Poderes, destacando o fanatismo e o imaginário messiânico

 

 

A invasão e depredação do Congresso Nacional, Palácio do Planalto e Supremo Tribunal Federal no dia 8 de janeiro de 2023 foi, segundo especialistas, um ato de revolução fantasiosa e fora de contexto histórico. Tales Ab´Sáber, psicólogo e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), avalia que os manifestantes agiram em um cenário já inviável para um golpe de Estado, uma vez que o ex-presidente Jair Bolsonaro havia deixado o Brasil e a tentativa estratégica de ruptura institucional estava desarticulada.

“A insurreição ocorreu quando Bolsonaro já havia fugido e a trama do golpe, que envolvia setores das Forças Armadas, já estava encerrada. Era uma tentativa de revolução imaginária, fora de tempo e inviável”, explicou Ab´Sáber. Ainda assim, ele destaca que o movimento violento teve razões concretas, alimentadas por meses de fanatismo.

O papel do fanatismo e da omissão

Ab´Sáber aponta que a mobilização anterior, com acampamentos em frente a quartéis e paralisações de caminhoneiros, criou um ambiente propício para o “ato fanático” da extrema-direita. “Havia um plano de golpe estruturado que alimentava a esperança entre os bolsonaristas”, disse. Para ele, Bolsonaro contribuiu diretamente para o caos ao não desmobilizar seus apoiadores.

O imaginário messiânico e o contexto psicológico

Christian Dunker, psicanalista e professor da USP, analisa que a mobilização bolsonarista foi alimentada por um conteúdo messiânico, velhos temores do comunismo e uma distorção histórica. Ele relata que, ao visitar acampamentos bolsonaristas antes da posse de Luiz Inácio Lula da Silva, encontrou pessoas em “desespero total”, muitas delas solitárias, endividadas e psicologicamente fragilizadas.

“Havia falas alteradas e um conteúdo messiânico exacerbado. Essas pessoas encontraram ali uma certa unidade, mesmo que delirante. Isso engaja pessoas errantes, com fragilidades mentais evidentes”, afirmou Dunker.

Para o psicanalista, o cenário também criou uma “expectativa de ruptura”. Ele compara o impacto das invasões à sensação de inevitabilidade que muitos tiveram durante os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001. “Era como se algo que estava no imaginário coletivo finalmente tivesse ocorrido.”

A importância do rito jurídico

Tales Ab´Sáber reforça a necessidade de que os atos criminosos de 8 de janeiro sejam tratados dentro do rito jurídico. “As pessoas precisam entender que tentativa de golpe é crime. Ou assentamos nossa constituição psiquicamente e subjetivamente, ou a destituímos como já ocorreu em outros momentos históricos.”

A análise dos especialistas ressalta a complexidade psicológica e social por trás da tentativa de golpe, evidenciando a urgência de ações para preservar a democracia e enfrentar os efeitos do fanatismo.