
Mudanças de rotina, noites curtas e excesso de estímulos desregulam o relógio biológico; especialistas alertam para impactos no humor, na imunidade e na tomada de decisões
O período de festas de fim de ano, marcado por celebrações, viagens e alterações bruscas na rotina, costuma trazer um efeito colateral comum: a desorganização do sono. Embora muitas pessoas vejam as noites maldormidas como um preço aceitável da diversão, a privação de sono pode trazer consequências importantes para a saúde física e mental.
Segundo a neurologista Letícia Soster, do Grupo Médico Assistencial do Sono do Einstein Hospital Israelita, a virada do ano reúne diversos fatores que desregulam o relógio biológico. “Quando mudamos nossa rotina, ficamos acordados até mais tarde, viajamos, aumentamos a exposição à luz artificial e quebramos a regularidade que mantém o ciclo sono-vigília funcionando”, explica.
A médica destaca que basta uma ou duas noites de sono insuficiente para o corpo começar a reagir. A região do cérebro mais afetada é o córtex pré-frontal, responsável pela atenção, memória e tomada de decisões. “Ele fica menos ativo, o que pode gerar dificuldade de concentração, lapsos de memória e comportamentos mais impulsivos”, afirma. Alterações de humor, como irritabilidade e impaciência, também são frequentes.
Além dos efeitos cognitivos, a privação de sono aumenta a resposta ao estresse, reduz a imunidade e pode interferir no controle da pressão arterial e da glicemia. Outro reflexo comum é o aumento do apetite por alimentos calóricos. “Quando não obtemos energia pelo sono, o corpo tenta compensar pela alimentação, especialmente com açúcar”, alerta Soster.
A especialista também desconstrói a ideia de que é possível “recuperar” o sono perdido com longos cochilos ou dormindo mais no dia seguinte. “Sono perdido é sono perdido. O corpo não funciona como uma máquina. O ideal é tentar manter alguma regularidade e não romper completamente o ritmo”, diz.
Para minimizar os impactos e ainda aproveitar as festas, pequenas medidas podem fazer diferença. Evitar excesso de álcool e cafeína à noite, por exemplo, contribui para um sono menos fragmentado. “O álcool induz um sono falso, que não é reparador e provoca mais despertares durante a noite”, explica a neurologista.
A exposição à luz natural pela manhã é outra estratégia importante para ajudar o organismo a se reorganizar. À noite, a recomendação é reduzir o uso de telas, fazer refeições leves e alternar dias de celebração com dias de descanso.
Caso o início do ano seja marcado por um sono totalmente desregulado, a orientação é priorizar a regularidade do horário de acordar. “A gente não controla exatamente a hora de dormir, mas pode controlar a de despertar. Manter um horário fixo e se expor à luz natural logo cedo ajuda a ressincronizar o corpo”, afirma Soster.
Planejamento também é fundamental nesse período: descansar antes de eventos noturnos, evitar várias noites seguidas de festas, manter boa hidratação e não agendar compromissos muito cedo após noites curtas são atitudes que ajudam a preservar a saúde. “É possível curtir as festas sem comprometer o equilíbrio que o corpo levou o ano inteiro para construir. O segredo está no equilíbrio”, conclui a médica.









