
Pesquisa da USP premiada mostra potencial do uso do hidrogênio na siderurgia; país tem condições naturais para liderar setor, mas enfrenta desafios de custo e infraestrutura
Por trás de cada ponte, arranha-céu, automóvel ou navio há uma cadeia produtiva que deixa marcas no planeta. A indústria do aço, essencial para a vida moderna, é também uma das maiores emissoras de dióxido de carbono (CO₂) no mundo. Para enfrentar esse impacto, a engenheira química Patrícia Metolina, vencedora do prêmio de teses da USP, propôs substituir o carvão pelo hidrogênio verde no processo de transformação do minério de ferro em aço.
A ideia, já testada em escala piloto na Suécia, pode reduzir drasticamente as emissões da siderurgia. “Nossas pesquisas mostram o potencial desse processo. Na Europa, grandes indústrias já validaram a tecnologia e investem em projetos para produzir o chamado aço verde”, explica Patrícia.
O hidrogênio verde é obtido pela eletrólise da água com energia renovável, separando hidrogênio e oxigênio. Ao substituir o coque de carvão na siderurgia, o subproduto deixa de ser CO₂ para se tornar apenas vapor d’água. Segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), o setor siderúrgico responde por um terço das emissões industriais e cerca de 7% do total mundial.
De olho no potencial, o Ministério de Minas e Energia lançou nesta semana o Portal Brasileiro de Hidrogênio, em parceria com a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), para atrair investimentos. A expectativa é aproveitar a abundância de energia solar e eólica no país, especialmente no Nordeste, para produzir hidrogênio a custos mais competitivos que na Europa.
Estudos do Hydrogen Council estimam que a demanda mundial por hidrogênio quintuplicará até 2050. O Brasil já conta com mais de 60 bilhões de dólares em projetos anunciados até 2026, concentrados no Complexo de Pecém (CE), em Minas Gerais e em Pernambuco. Empresas como Fortescue, Casa dos Ventos e Atlas Agro lideram os investimentos, voltados também à produção de fertilizantes, amônia e metanol.
Apesar do entusiasmo, os desafios ainda são grandes. Custos elevados de produção, falta de infraestrutura logística, dependência de água de qualidade e ausência de marco regulatório claro travam a expansão. Projetos de pesquisa, como os conduzidos pela Coppe/UFRJ, enfrentam problemas desde a pureza da água até a manutenção de equipamentos importados.
Para a professora Andrea Santos, da Coppe, os investimentos em pesquisa e inovação são decisivos: “Qualquer tecnologia no início é mais cara, mas não podemos usar isso como desculpa diante da urgência climática. O Brasil tem condições de produzir hidrogênio mais barato e se tornar protagonista dessa transição”.