Consciência ambiental cresce até 20% em regiões com projetos de conservação de longo prazo

© Tomaz Silva/Agência Brasil

Pesquisa da Unifesp em parceria com a Rede Biomar mostra impacto direto de iniciativas contínuas na relação das comunidades com o oceano

Projetos de conservação marinha com atuação contínua e de longo prazo podem elevar em até 20% a consciência ambiental das populações costeiras. A conclusão é de um estudo inédito realizado pelo Programa Maré de Ciência, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em parceria com a Rede Biomar — que reúne cinco grandes iniciativas de proteção marinha: Albatroz, Baleia Jubarte, Coral Vivo, Golfinho Rotador e Meros do Brasil.

A pesquisa, conduzida em maio com 1.803 entrevistados, mostra que moradores de regiões onde esses projetos atuam há mais de duas décadas apresentam maior percepção sobre sua relação com o oceano e maior disposição para adotar hábitos ambientalmente responsáveis. Entre os participantes, 1.501 afirmaram conhecer ao menos um dos projetos da Rede Biomar; outros 302 formaram o grupo controle, sem contato prévio com as iniciativas.

Os dados revelam que os projetos de longa duração aumentam em mais de 10% a percepção de conexão das pessoas com o oceano, chegando a 20% em alguns contextos. Para os pesquisadores, o levantamento reforça o papel central da educação ambiental contínua no comportamento socioambiental das comunidades.

Impacto direto na relação com o oceano

Segundo o estudo, a percepção de como o oceano influencia a vida cotidiana é 11% maior entre aqueles familiarizados com a Rede Biomar. Além disso, 88% dos conhecedores dos projetos afirmam buscar informações sobre temas marinhos — número 23% superior ao do grupo controle.

A motivação para contribuir com a conservação também é marcante: 87% dos entrevistados que conhecem os projetos dizem sentir vontade de ajudar, enquanto no grupo controle esse índice é de apenas 13%. Entre os participantes ligados à Rede Biomar, 82% estão dispostos a mudar hábitos em prol do oceano; quase metade se declarou “extremamente disposta”.

Mais de 90% dos conhecedores afirmaram que atuariam como agentes de mudança ambiental, o que representa um índice 12% maior do que entre os que não conhecem os projetos.

Planejamento estratégico e educação de longo prazo

A pesquisa integra o planejamento da Rede Biomar para a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável (ONU), que vai até 2030. Para Tatiana Neves, fundadora do Projeto Albatroz, a avaliação é fundamental para aprimorar estratégias.

“Os resultados mostram como estamos impactando, mas também apontam os caminhos para melhorar nossas ações. Foi um divisor de águas”, afirmou.

O coordenador do Programa Maré de Ciência, Ronaldo Christofoletti, destacou que a educação ambiental exige tempo e continuidade. “Quando você tem projetos há mais de 20 ou 30 anos no território, o conhecimento e a consciência aumentam de forma consistente”, disse.

Desafio: transformar preocupação em ação prática

Apesar da ampliação da consciência, Tatiana Neves afirma que ainda falta clareza sobre como agir no dia a dia. “As pessoas querem ajudar, mas muitas vezes não sabem por onde começar”, explicou.

Entre as ações positivas que podem ser incorporadas ao cotidiano, ela cita a redução do uso de plástico descartável, a busca por produtos sustentáveis e a participação em mutirões de limpeza.

Christofoletti reforça que as estratégias de educação devem ser adaptadas a diferentes públicos, considerando idade, linguagem, instrução e regionalidades. “É um processo construído de baixo para cima, junto com as comunidades.”

Da educação ao engajamento coletivo

Para Tatiana, um dos obstáculos ao engajamento é o sentimento de que apenas governos são responsáveis pela conservação ambiental. “Isso cria uma sensação de impotência. Precisamos mostrar o que cada indivíduo pode fazer”, disse.

Ambos os especialistas destacam a necessidade de investimentos de longo prazo em educação ambiental, como os mantidos pela Petrobras na Rede Biomar.

Christofoletti também ressaltou o papel das políticas públicas, citando o Currículo Azul — política que integra a educação oceânica ao currículo escolar brasileiro. A iniciativa deve alcançar todas as redes de ensino e busca fortalecer a compreensão da importância dos oceanos e sua relação com todos os biomas.

Transformação que começa cedo

Segundo o pesquisador, a mudança comportamental desejada deve começar na infância. “Isso deveria estar nas escolas desde o maternal até o ensino superior”, argumentou.

A expectativa é que novas pesquisas sejam realizadas ao longo da Década do Oceano para ajustar estratégias e medir impactos.

Rede Biomar e Maré de Ciência

Criada em 2007, a Rede Biomar atua em pesquisa científica, conservação da biodiversidade e educação ambiental ao longo do litoral brasileiro, com foco em espécies e ecossistemas-chave. Seus projetos combinam ações de pesquisa, envolvimento comunitário e atividades educativas.

Já o Programa Maré de Ciência, da Unifesp, criado em 2012, se dedica à popularização da ciência e ao fortalecimento da cultura oceânica no país, promovendo ações que conectam sociedade, escolas, governos e setor produtivo.

Ambas as iniciativas reforçam que educação contínua, engajamento social e políticas públicas robustas são pilares indispensáveis para transformar a relação das pessoas com o oceano e para formar futuras gerações de cidadãos conscientes e comprometidos com a conservação ambiental.