Austrália inclui YouTube em proibição de redes sociais para menores de 16 anos

Foto de Szabo Viktor na Unsplash

Nova legislação que entra em vigor em dezembro busca proteger crianças do acesso a conteúdos nocivos online; plataformas que não cumprirem as regras poderão ser multadas em até R$ 165 milhões

A Austrália anunciou nesta quarta-feira (30) que o YouTube será incluído na legislação que proíbe o acesso de menores de 16 anos a redes sociais, contrariando uma promessa anterior de isentar a plataforma. A medida, que já abarcava gigantes como Facebook, Instagram, TikTok, Snapchat e X (antigo Twitter), agora também coloca o YouTube — pertencente à Alphabet, controladora do Google — sob as mesmas exigências legais. A nova regra entra em vigor em dezembro deste ano.

Segundo a legislação, as plataformas terão a responsabilidade de impedir que crianças com menos de 16 anos criem contas em seus serviços. O descumprimento pode gerar multas de até 50 milhões de dólares australianos, cerca de R$ 165,5 milhões.

A decisão foi duramente criticada por representantes do YouTube, que alegam que a medida quebra um compromisso público do governo de tratar a plataforma como uma ferramenta educacional. Um porta-voz da empresa afirmou que “vai considerar os próximos passos e continuar o diálogo com o governo”, sem comentar sobre eventuais ações judiciais. O YouTube Kids, voltado ao público infantil, seguirá isento da proibição por não permitir envio de vídeos nem comentários.

Pressão por segurança infantil

A Ministra das Comunicações da Austrália, Anika Wells, justificou a inclusão do YouTube com base em uma recente pesquisa da eSafety Commission, que revelou que 37% das crianças australianas relataram ter sido expostas a conteúdos prejudiciais na plataforma. Entre os materiais considerados nocivos estão vídeos com ideais misóginos, desafios perigosos, cenas de violência e estímulo a comportamentos alimentares e físicos prejudiciais.

“Não podemos controlar o oceano, mas podemos policiar os tubarões”, disse Wells, comparando o acesso infantil às redes sociais a nadar em mar aberto. “Esta é uma luta genuína pelo bem-estar das crianças australianas. Não me deixarei intimidar por ameaças legais.”

Wells destacou ainda que o YouTube emprega as mesmas estratégias de engajamento que outras redes sociais — como rolagem infinita, reprodução automática e algoritmos personalizados — que, segundo ela, prejudicam a saúde mental infantil.

Legislação pioneira e desafios técnicos

A legislação australiana, considerada uma das mais rígidas do mundo nesse tema, foi aprovada no ano passado com um período de 12 meses para testes e análises técnicas. Um relatório preliminar divulgado em junho concluiu que é possível implementar sistemas de verificação de idade que sejam “privados, robustos e eficazes”, embora ainda não exista uma solução única e 100% infalível.

O relatório também alertou sobre riscos à privacidade, ao identificar que algumas plataformas estavam desenvolvendo ferramentas capazes de rastrear e registrar ações dos usuários durante a verificação de idade — algo que poderia acarretar uso indevido de dados pessoais.

Críticas e resistência da indústria

Empresas de tecnologia e defensores da liberdade digital têm feito forte lobby contra a nova legislação, argumentando que ela pode isolar crianças vulneráveis que dependem das redes como forma de apoio e conexão social.

O YouTube afirmou nesta semana que está testando uma tecnologia de inteligência artificial para identificar usuários menores de idade nos EUA com base em seus padrões de navegação. Se detectada uma conta de adolescente, anúncios personalizados seriam desativados, ferramentas de bem-estar ativadas e a repetição de vídeos restrita.

Plataformas como TikTok também têm investido em campanhas publicitárias para promover suas redes como ambientes educacionais. Em uma tentativa inusitada de influenciar o governo, o YouTube chegou a enviar um integrante dos Wiggles — popular grupo musical infantil australiano — para conversar com a ministra.

“Disse a eles: vocês estão defendendo que meus filhos de 4 anos tenham conta no YouTube, enquanto quatro em cada dez colegas deles estão sendo prejudicados por essa plataforma. Eles podem ser dois desses quatro”, rebateu Wells.

O que dizem os dados

A pesquisa “Keeping Kids Safe”, realizada entre dezembro de 2024 e fevereiro de 2025 com quase 3.500 crianças australianas entre 10 e 17 anos, revelou que 75% delas já viram algum tipo de conteúdo prejudicial online. A constatação reforçou a pressão sobre o governo para tomar medidas mais contundentes de proteção.

Apesar de reconhecer que crianças ainda poderão burlar as restrições — “Talvez todas invadam o LinkedIn”, brincou Wells —, a ministra acredita que a medida representa um passo necessário para preservar a segurança digital da próxima geração.