
Nenhum estado atingiu meta de cobertura para todas as vacinas em 2023; desigualdade entre municípios e abandono do esquema vacinal preocupam.
Apesar dos sinais de recuperação, a cobertura vacinal infantil no Brasil continua aquém do ideal e apresenta grandes desigualdades entre estados e municípios. É o que revela o Anuário VacinaBR, lançado pelo Instituto Questão de Ciência (IQC), em parceria com a Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim) e o Unicef.
O levantamento mostra que, em 2023, nenhuma das vacinas do calendário nacional atingiu 95% de cobertura em todos os estados, percentual mínimo para conter surtos. Os piores resultados foram para as vacinas contra poliomielite, meningite C, varicela e Haemophilus influenzae tipo B.
Apenas 32% dos municípios brasileiros atingiram a meta para quatro vacinas prioritárias — pentavalente, poliomielite, pneumo-10 e tríplice viral. O Ceará teve o melhor desempenho, com 59% das cidades cumprindo as metas; no Acre, o índice foi de apenas 5%.
“A gente viu que até municípios vizinhos, com características parecidas, tiveram resultados muito diferentes. Isso mostra que a gestão local faz toda a diferença”, analisa Paulo Almeida, diretor do IQC e um dos organizadores do anuário.
A situação da vacina BCG, aplicada geralmente ainda na maternidade, também preocupa. Apenas oito estados atingiram a meta, enquanto em 11 unidades federativas a cobertura ficou abaixo de 80%. No Espírito Santo, menos de 58% dos recém-nascidos foram vacinados.
Isabela Ballalai, diretora da Sbim, alerta que a baixa percepção de risco e dificuldades de acesso são obstáculos sérios. “Se a vacina acaba no posto, ou a informação é errada, a pessoa desiste de voltar. E se o horário não permite, principalmente para quem trabalha, a criança deixa de ser imunizada.”
Desde 2015, as taxas de cobertura vêm caindo, com queda mais acentuada em 2021. A recuperação nos anos seguintes ainda não foi suficiente para alcançar os índices ideais. O abandono vacinal — quando a criança inicia, mas não completa o esquema — segue alto, especialmente para vacinas como a tríplice viral, que protege contra sarampo, caxumba e rubéola. Em 2023, menos da metade das crianças recebeu a segunda dose em 14 estados.
Isabela defende estratégias como vacinação em escolas para facilitar o acesso e conscientizar as famílias. Já Almeida propõe o uso de tecnologia: “Um simples SMS pode lembrar o cuidador do compromisso com a vacinação. Muitas vezes, a intenção existe, mas a rotina impede.”
A retomada da confiança e da efetividade do Programa Nacional de Imunizações (PNI) depende, segundo os especialistas, de campanhas mais eficazes, informação clara e acessível, e, acima de tudo, um esforço conjunto entre União, estados e municípios.