Lula propõe envolvimento direto da ONU na missão de paz no Haiti

© Ricardo Stuckert/PR

 

Durante a abertura da Cúpula Brasil-Caribe nesta sexta-feira (13), no Palácio Itamaraty, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu que a Organização das Nações Unidas (ONU) assuma o financiamento da Missão Multinacional de Apoio à Segurança (MSS) no Haiti ou converta a operação em uma nova missão de paz sob seu comando. A iniciativa visa conter a escalada de violência causada por gangues que dominam parte da capital haitiana, Porto Príncipe, e outras áreas estratégicas do país.

Lula criticou a negligência internacional em relação à crise no Haiti, classificando a situação como uma extensão do histórico de punições impostas ao país por ter sido o primeiro a conquistar a independência nas Américas. “Se ontem a punição veio sob forma de indenizações injustas e ingerência externa, hoje se reflete em postura de abandono e indiferença”, declarou.

A atual missão no Haiti, liderada pelo Quênia e aprovada pela ONU em outubro de 2023, não integra oficialmente a estrutura das Nações Unidas e depende de contribuições voluntárias. Segundo o presidente, o Brasil vai colaborar com o treinamento de 400 policiais haitianos por meio da Polícia Federal. “Estabilizar a situação de segurança é fundamental para que se possa dar o próximo passo do processo político e realizar eleições presidenciais”, afirmou.

Além da segurança, Lula anunciou que o Haiti será um dos primeiros beneficiários da Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza, projeto liderado pelo Brasil. A iniciativa será apoiada por recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), com foco na criação de um programa de transferência de renda.

O presidente também relembrou o protagonismo brasileiro na Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (Minustah), encerrada em 2017 após 13 anos de atuação, e destacou que o Brasil concedeu mais de 90 mil vistos humanitários a haitianos desde 2012.

Integração regional e combate à fome

A cúpula, que reúne líderes de 13 países caribenhos, além de Cuba, República Dominicana e organismos regionais, tem como principais temas a segurança alimentar, mudanças climáticas, transição energética e conectividade. Lula anunciou que Santa Lúcia, Cuba e o Banco de Desenvolvimento do Caribe agora integram a Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza. Mais de 12 milhões de pessoas ainda sofrem com a fome na região.

O presidente brasileiro defendeu o fortalecimento da Rede de Sistemas Públicos de Abastecimento da América Latina e Caribe e ofereceu apoio técnico para a formação de estoques públicos de alimentos. “Sei do interesse do Caribe de diversificar seus fornecedores de alimentos”, afirmou, propondo maior integração comercial e infraestrutura de transporte entre Brasil e os países da região.

Clima e energia: uma cooperação estratégica

No campo ambiental, Lula cobrou metas ambiciosas dos países para a 30ª Conferência da ONU sobre Mudança do Clima (COP30), marcada para novembro em Belém. Ele destacou a parceria com a Dinamarca para oferecer suporte técnico aos países caribenhos na formulação de compromissos climáticos e anunciou que o Inpe ajudará a monitorar os efeitos da elevação do nível do mar.

Quanto à transição energética, o presidente defendeu que países em desenvolvimento não sejam penalizados. Ele destacou o potencial do Caribe para a geração de energia eólica e solar e anunciou o envio de uma missão técnica do Ministério de Minas e Energia para estudar parcerias na área. “O Caribe, que divide esse passado com o Brasil, também pode fazer parte deste futuro”, disse Lula, referindo-se ao uso de biocombustíveis como alternativa sustentável.

Diplomacia e investimentos

Lula também reforçou a importância de ampliar a conectividade com o Caribe para impulsionar o comércio e criticou a predominância de importações de países distantes, como EUA, China e Alemanha. “A escassez de conexões explica por que o Caribe importa mais desses países do que do Brasil”, afirmou.

Durante a cúpula, foram assinados acordos de cooperação aérea com Barbados e Suriname, além de um aporte de US$ 5 milhões do Brasil ao fundo especial de desenvolvimento do Banco de Desenvolvimento do Caribe. Lula anunciou ainda que US$ 3 bilhões da carteira de investimentos brasileira no BID serão direcionados a projetos em países sul-americanos, com destaque para iniciativas na Guiana e no Suriname, “portas naturais para o Caribe”.

Ao encerrar seu discurso, Lula criticou o embargo dos EUA contra Cuba e pediu mais vozes em defesa do que classificou como “justo e sensato” no cenário internacional. “O mundo está carente de vozes que falem em nome do que é certo. O Brasil sempre viu no Caribe essa vocação.”