Bilionários enriqueceram em ritmo recorde, enquanto desigualdade global e pobreza persistem; estudo reforça necessidade de reformas tributárias e justiça social
A concentração de riqueza global alcançou novos recordes em 2024, segundo relatório divulgado pela ONG internacional Oxfam. O documento, publicado às vésperas do Fórum Econômico de Davos, aponta que surgiram 204 novos bilionários no último ano, enquanto os mais ricos do planeta acumularam fortunas em ritmo três vezes superior ao de 2023.
Os bilionários — hoje pouco mais de 2.900 pessoas — enriqueceram, em média, US$ 2 milhões por dia. Os dez mais ricos adicionaram US$ 100 milhões diários às suas fortunas. Para efeito de comparação, uma pessoa que recebe um salário mínimo no Brasil levaria 109 anos para atingir o equivalente a R$ 2 milhões, e 650 anos para alcançar US$ 2 milhões.
Enquanto isso, a pobreza global segue como um desafio estrutural. Segundo o relatório, 44% da população mundial vive com menos de US$ 6,85 por dia, e o número de pessoas em situação de pobreza extrema (com renda inferior a US$ 2,15 por dia) caiu de 29,3% em 2000 para 9% em 2023. Contudo, o Banco Mundial indica que o progresso no combate à pobreza global praticamente estagnou desde 1990.
Desigualdade no Brasil reflete cenário global
O Brasil também enfrenta desafios extremos em relação à desigualdade. Durante a pandemia, o país registrou a ascensão de dez novos bilionários, enquanto milhões de pessoas foram empurradas para a pobreza ou para a insegurança alimentar. Atualmente, menos de 100 bilionários detêm R$ 146 bilhões, evidenciando a disparidade.
Para Viviana Santiago, diretora executiva da Oxfam Brasil, a desigualdade no país está diretamente ligada à ausência de uma tributação progressiva e à concentração de riqueza. “Enquanto temos pessoas trabalhando e ainda incapazes de garantir sua subsistência, há um pequeno grupo acumulando fortunas. Essa lógica é sustentada por um sistema fiscal que privilegia as elites e penaliza os trabalhadores,” explica.
Propostas para um mundo mais justo
O relatório da Oxfam sugere medidas para reduzir drasticamente a desigualdade global. Entre as principais propostas estão:
- Tributação progressiva: Implementar impostos mais altos para as pessoas e empresas mais ricas.
- Reparações históricas: Reconhecer e reparar os impactos do colonialismo.
- Reforma das instituições financeiras: Democratizar o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, hoje controlados majoritariamente pelo Norte Global.
- Metas de redução da desigualdade: Estabelecer objetivos globais e nacionais para garantir que a renda dos 10% mais ricos não ultrapasse a dos 40% mais pobres.
O estudo também destaca a necessidade de fortalecer serviços públicos, implementar reformas agrárias e promover a cooperação econômica entre os países do Sul Global como formas de combater a concentração de renda e ampliar o acesso a direitos básicos.
Persistência das desigualdades
Apesar de avanços localizados, como a redução da pobreza extrema em países asiáticos liderados pelo crescimento chinês, o relatório conclui que a desigualdade segue sendo um obstáculo global. “Sem mudanças estruturais e comprometimento institucional, estaremos perpetuando um sistema que privilegia poucos às custas da maioria,” ressalta Viviana Santiago.
A publicação reforça o chamado por justiça econômica, ecoando a reflexão de Don Quixote, de Cervantes: “Mudar o mundo não é loucura, nem utopia, é justiça.”