Especialistas analisam os impactos econômicos e geopolíticos da estratégia do presidente eleito dos EUA para manter a hegemonia do dólar
A recente declaração de Donald Trump, presidente eleito dos Estados Unidos, ameaçando taxar em 100% as importações dos países do Brics que substituírem o dólar em transações comerciais, reflete a tentativa de preservar a hegemonia da moeda estadunidense no comércio internacional. Especialistas consultados destacam os impactos dessa postura na geopolítica global e nos próprios interesses comerciais dos EUA.
Segundo o professor Gilberto Maringoni, da Universidade Federal do ABC (UFABC), o dólar é uma das principais ferramentas de poder dos EUA. “A perda da supremacia do dólar representa uma diminuição do poder imperial americano sobre o mundo, pois a moeda regula as transações globais e influencia taxas de juros em economias periféricas como o Brasil”, analisa.
A preocupação de Trump surge em meio às discussões sobre alternativas ao dólar promovidas pelos Brics. Durante a cúpula do bloco em Kazan, na Rússia, foram debatidas estratégias para utilizar moedas locais e até criar uma moeda comum. Essa proposta é apoiada por lideranças como o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva e a ex-presidenta Dilma Rousseff, atual presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD).
Riscos Internos e Limitações
Apesar de Trump enfatizar que “qualquer país que tente substituir o dólar deve dizer adeus à América”, especialistas alertam para os riscos dessa política. Ronaldo Carmona, pesquisador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), aponta que uma taxação agressiva sobre importações pode elevar os preços de produtos nos EUA, agravando a inflação.
Maringoni reforça que muitos produtos essenciais à economia americana, como madeira e componentes eletrônicos, vêm de países que poderiam ser alvo das tarifas de Trump. Empresas como Tesla e Apple, que mantêm fábricas na China, seriam diretamente impactadas, aumentando custos para consumidores americanos.
Brasil e os Brics
O Brasil tem sido um dos países mais vocalmente favoráveis à redução da dependência do dólar. Durante a cúpula do Brics de 2023, Lula afirmou que uma moeda comum entre os membros do bloco poderia reduzir vulnerabilidades e facilitar transações comerciais. Essa visão é compartilhada por Dilma Rousseff, que tem defendido o uso de moedas locais no NBD como forma de fortalecer a autonomia econômica dos países-membros.
Geopolítica do Dólar
A tentativa de Trump de preservar a hegemonia do dólar ocorre em um contexto de crescente contestação global. O congelamento de reservas russas em dólar para financiar a Ucrânia exemplifica como a moeda tem sido usada como ferramenta geopolítica, despertando esforços de diversificação por parte de outros países.
“A manutenção da hegemonia do dólar é uma peça central na geopolítica americana, mas também é um ponto de vulnerabilidade. A dependência excessiva pode gerar reações adversas e acelerar movimentos de substituição, como os que estamos vendo nos Brics”, conclui Carmona.
Conclusão
Embora a estratégia de Trump reflita a preocupação legítima dos EUA em preservar sua influência econômica, ela pode gerar impactos econômicos adversos internamente e intensificar esforços internacionais para buscar alternativas ao dólar. O debate sobre uma moeda global alternativa está longe de ser resolvido, mas reflete mudanças significativas no equilíbrio de poder econômico mundial.