Situação de rua: desafios e promessas eleitorais

© Fernando Frazão/Agência Brasil

 

Diego Augusto, morador em situação de rua há cinco anos no Rio, denuncia as promessas vazias dos candidatos, enquanto especialistas reforçam a importância de pressionar por políticas efetivas nas eleições de 2024

 

 

 

Diego Augusto vive há cinco anos nas ruas do centro do Rio de Janeiro e, em sua trajetória, passou por diversos albergues e serviços de acolhimento, mas sua avaliação é negativa. Ele descreve os albergues como insalubres, com “percevejos infestando os locais” e critica os educadores sociais, que chama de “opressores sociais”. Para ele, as promessas dos candidatos que aparecem em épocas eleitorais são “hipocrisia”. Diego, assim como muitos outros, perdeu a paciência com as promessas vazias e incentiva que a população “lute e manifeste sua indignação pelos direitos violados”.

As eleições municipais de 2024 serão um momento importante para cobrar dos candidatos políticas voltadas à população em situação de rua. A responsabilidade pela estrutura de acolhimento e assistência social é das prefeituras, tornando crucial que os eleitores pressionem por propostas concretas de amparo e proteção a essa população vulnerável.

A luta pela visibilidade e dignidade

Ana Paula Mauriel, assistente social e professora da Universidade Federal Fluminense (UFF), ressalta que pessoas em situação de rua têm organização política própria e precisam ser ouvidas. “Eles têm fóruns de defesa de seus direitos, mas não podem lutar sozinhos. É importante que a sociedade fortaleça essa luta, dando voz e visibilidade às necessidades dessa população”, afirma Ana Paula.

A Política Nacional para a População em Situação de Rua, criada em 2009, estabeleceu diretrizes de assistência social, saúde e moradia, mas a adesão dos municípios foi mínima. Em 2023, apenas 18 cidades aderiram ao plano, apesar de existirem mais de 5.500 municípios no Brasil. O governo federal lançou recentemente o “Plano Ruas Visíveis”, que destina R$ 982 milhões para ações voltadas à população de rua, mas até agora apenas Rio de Janeiro e Belo Horizonte aderiram ao projeto.

A falta de dados e o desafio do acolhimento

Um dos grandes problemas na formulação de políticas públicas para essa população é a falta de dados atualizados. O último censo nacional sobre a população em situação de rua foi realizado em 2008. Desde então, as estimativas têm se baseado em dados do Cadastro Único (CadÚnico), que em 2023 indicava a existência de 236.400 pessoas vivendo nessa condição.

Em São Paulo, por exemplo, o último censo de 2021 apontava 31.884 pessoas em situação de rua, mas pesquisadores da UFMG utilizaram dados do CadÚnico para estimar 64.818 pessoas em 2023, revelando a falta de atualização e precisão no monitoramento da situação.

O papel dos municípios e a necessidade de mudanças

Além da urgência de um levantamento atualizado, a estrutura de acolhimento oferecida pelos municípios é insuficiente. No Rio de Janeiro, em 2022, havia 7.865 pessoas em situação de rua e apenas 2.200 vagas nos abrigos, o que demonstra um déficit grave.

A saúde também é uma questão importante. Embora o SUS ofereça atendimento à população em situação de rua, o programa “Consultório na Rua”, voltado para essa população, está presente em apenas 138 municípios.

Para Ana Paula Mauriel, os candidatos às prefeituras precisam focar em uma abordagem mais humanizada e especializada. “Não é a polícia recolhendo pertences, é uma abordagem com equipes capacitadas que conversam e acolhem. Não se trata de segurança pública, mas de assistência social”, reforça.

A esperança na sociedade civil

Para Diego Augusto, que há tanto tempo vive nas ruas, a mudança não virá das autoridades, mas da mobilização da sociedade civil. “Eu não vejo mais esperança nas autoridades municipais. A sociedade civil, sim. Quando ela se organizar para lutar pelos direitos violados, aí, sim, os direitos virão para as nossas vidas”, conclui.

As eleições de 2024 são uma oportunidade para transformar essa realidade, mas, para isso, a sociedade precisa cobrar comprometimento e ações concretas dos candidatos.

 

 

Com informações da Agência Brasil