Especialistas afirmam que aumento dos preços nos estádios está mudando o perfil do público e prejudicando a tradição das torcidas
A final da última edição da Copa do Brasil entre Flamengo e São Paulo, com entradas que variaram de R$ 400 a R$ 4.500 na partida de ida no estádio do Maracanã, trouxe à tona uma questão que vem se acentuando no mundo do futebol: a elitização do esporte mais popular do planeta. De acordo com pesquisadores, a crescente valorização dos ingressos é apenas mais um indício desse processo.
O jornalista e pesquisador Irlan Simões, do Laboratório de Estudos em Mídia e Esporte da UERJ, em entrevista à Agência Brasil, apontou que um dos resultados desse aumento de preços é a mudança no perfil dos torcedores presentes nos estádios: “Não houve um esvaziamento dos estádios, mas talvez uma substituição do público. Talvez por conta da sensação de elitização que as novas políticas de precificação provocaram. No entanto, uma década após a inauguração das modernizadas arenas, parece que se reconheceu o fracasso do projeto inicial. É necessário manter setores populares dentro do estádio, do contrário ele ficará vazio.”
Essas novas políticas de precificação mencionadas por Irlan estão diretamente ligadas à modernização dos estádios. Muitos deles passaram por reformas para receber jogos da Copa do Mundo de 2014 no Brasil, o que resultou na extinção de setores considerados democráticos, como a geral. Como consequência, parte das camadas populares de torcedores de futebol foi substituída nas arquibancadas, muitas vezes por torcedores de maior poder aquisitivo.
Pedro Daniel, pesquisador da consultoria EY, observa que, em algumas ocasiões, os espaços dos estádios se tornam pequenos demais para o público interessado em acompanhar as partidas: “Temos atualmente 14 estádios, sendo 12 de Copa do Mundo, além dos estádios de Grêmio e Palmeiras. A demanda é muito alta, mas o espaço é limitado. Por outro lado, é essencial que os clubes entendam quem eles desejam envolver. Cada time deve fazer essa reflexão, pois há um equilíbrio a ser mantido. A correlação entre aspectos financeiros e esportivos é direta, e não se pode favorecer demais um em detrimento do outro.”
Como tentativa de encontrar um equilíbrio nesse desafio, Irlan Simões defende uma maior participação política dos torcedores nos clubes: “Frequentemente, os dirigentes ou conselheiros mais influentes desconhecem completamente a realidade do torcedor comum, as dificuldades em pagar um plano de sócio-torcedor e o deslocamento até o estádio. Acredito que, à medida que grupos de torcedores tenham voz ativa, haverá uma aprendizagem mútua.”