Estudantes de licenciatura no Brasil não cumprem carga horária mínima de estágio obrigatório, aponta Enade

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Dados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) revelam desafios na formação de futuros professores no país

 

 

 

A maioria dos estudantes de licenciatura no Brasil não cumpre a carga horária mínima exigida no estágio obrigatório, revelam dados do último Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), referente a 2021. Além disso, cerca de um a cada dez futuros professores sequer realizou o estágio, um componente vital para sua formação como educadores. Os dados foram compilados pelo Todos pela Educação e compartilhados com exclusividade para a Agência Brasil.

O estágio obrigatório é um período em que os estudantes de licenciaturas acompanham a rotina escolar, sob supervisão de professores, a fim de se prepararem para a carreira docente. De acordo com a resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE), esse estágio deve ter uma duração mínima de 400 horas.

No entanto, os dados do Enade demonstram que essa regra não está sendo efetivamente cumprida na prática. O exame é realizado por estudantes concluintes de cursos de graduação, avaliando um conjunto diferente de cursos a cada ano. Em 2021, foram as licenciaturas. Os resultados revelaram que aproximadamente 55% dos concluintes em licenciaturas, o que equivale a cerca de 165 mil estudantes, declararam ter cumprido menos de 300 horas de estágio. Adicionalmente, 11,82%, correspondendo a 35,5 mil alunos, afirmaram não ter realizado o estágio. Apenas 13,71%, cerca de 41,2 mil, realizaram estágios de mais de 400 horas, atendendo à carga horária mínima.

Ivan Gontijo, gerente de Políticas Educacionais do Todos Pela Educação, destaca a importância do estágio na conexão entre teoria e prática. “O estágio permite essa conexão da teoria com a prática. Tudo que se aprende na teoria, se vê aplicações práticas na escola”, afirma. Ele ressalta que a carga horária é extensa porque o estágio tem caráter de observação progressiva, permitindo aos estudantes participar cada vez mais das atividades pedagógicas.

Gontijo reconhece o impacto da pandemia na formação dos estudantes de 2021, que enfrentaram o fechamento das escolas por pelo menos um ano. No entanto, os dados do Enade mostram que, mesmo antes da pandemia, o estágio não era completamente cumprido. Em anos anteriores de avaliação das licenciaturas, como 2014 e 2017, cerca de 3% dos estudantes declararam não ter realizado o estágio, e cerca de 60% não cumpriram a carga horária mínima.

Para receber o diploma, os estudantes devem cumprir o estágio. Gontijo observa que as altas porcentagens de estudantes que declaram não ter concluído os estágios podem ser devido à obtenção de documentos que atestem a prática ou à realização do estágio de forma não estruturada, dando a sensação de que não foi cumprido.

Gina Vieira, professora aposentada da rede pública e atualmente professora voluntária na Universidade de Brasília (UnB), ressalta a importância do estágio para uma formação de qualidade. “A formação dos professores tem sido cada vez mais frágil e insipiente, pois formar um bom profissional é caro”, afirma. Ela destaca as dificuldades enfrentadas pelos estudantes de licenciatura, muitas vezes tendo que conciliar a formação com trabalho e outras demandas, o que dificulta o cumprimento da carga horária mínima de estágio.

O questionário do Enade ainda revela que a maioria dos formandos em cursos de formação docente deseja atuar nas escolas, sendo que 64% almejam atuar em escolas públicas a médio prazo, daqui a cinco anos. A necessidade de proporcionar aos futuros profissionais contato com a prática pedagógica é enfatizada, e Gina Vieira defende a ampliação da carga horária de estágio. Atualmente, dos 1.648.328 matriculados em cursos de licenciatura, 35,6% estão em instituições públicas, e 64,4%, em instituições privadas de ensino superior, conforme o último Censo da Educação Superior de 2021. Desses estudantes, 61% frequentam cursos a distância.