Uso terapêutico da cannabis: Uma história de dor e esperança

© Arquivo pessoal/Fábio Carvalho

 

Vivian Dalla Colletta, farmacêutica e pesquisadora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), enfrentava há oito anos uma batalha contra a fibromialgia, uma síndrome de dor crônica que a afligia constantemente. Em busca de alívio para as intensas dores, ela se viu diante da possibilidade de utilizar a cannabis como planta medicinal.

Em uma entrevista à Agência Brasil durante a 2ª edição da Conferência Internacional da Cannabis Medicinal (CICMED), em São Paulo, Vivian relatou como a cannabis mudou sua vida. Após uma cirurgia de apendicite que resultou na lesão de um nervo em sua perna, ela passou a sofrer com dores intensas que a levaram a tomar quatro remédios de tarja vermelha. A situação se tornou ainda mais angustiante quando o médico sugeriu a prescrição de um quinto medicamento, o que a deixou assustada.

Lembrando de pacientes com câncer que utilizavam a cannabis para aliviar a dor, Vivian decidiu experimentar o óleo de cannabis como alternativa aos medicamentos convencionais. O resultado foi surpreendente. Desde então, ela não precisou mais utilizar outros medicamentos para dor, apenas o extrato da planta. Vivian também revelou que a cannabis tem sido uma aliada importante em sua recuperação após uma cirurgia de câncer no intestino.

A CICMED, que ocorre até o próximo sábado, reúne especialistas nacionais e internacionais, laboratórios e distribuidores de medicamentos à base de cannabis medicinal para discutir e disseminar novas tendências de uso da substância em diversos campos da medicina.

Apesar dos benefícios comprovados cientificamente, o uso da cannabis ainda não é livre no Brasil. Para ter acesso aos produtos à base de cannabis, é necessário que um médico prescreva o tratamento. Atualmente, existem três formas de acesso ao canabidiol, uma das substâncias derivadas da cannabis: através de farmácias, associações ou importação. No entanto, não há ainda uma política de fornecimento gratuito de produtos à base de cannabis medicinal pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Diversos projetos de lei em nível estadual têm sido propostos para garantir o acesso desses produtos pelo SUS, mas a ausência de um marco regulatório nacional ainda é um obstáculo. A regulação adequada poderia não só facilitar o acesso a esses medicamentos para milhões de brasileiros, mas também reduzir significativamente os custos, tornando a cannabis medicinal mais acessível e beneficiando pacientes que necessitam dessa terapia.

Outra questão que tem sido levantada é a dependência do Brasil em matéria-prima estrangeira para a produção dos medicamentos à base de cannabis, embora o país seja um dos principais exportadores agrícolas do mundo. Para alguns especialistas, está na hora de o Brasil investir na produção nacional, não apenas comprando a matéria-prima, mas cultivando e produzindo medicamentos à base de cannabis no país.

Vivian Dalla Colletta ressalta que o programa Farmácias Vivas, instituído pelo Ministério da Saúde em 2010, poderia ser uma solução para facilitar o acesso à cannabis medicinal no Brasil. O programa permite o cultivo, coleta, processamento e manipulação de plantas medicinais, o que poderia fornecer fitoterápicos à população via SUS. Porém, a falta de uma lei que proteja o programa tem sido um entrave.

Enquanto o Brasil continua avançando no uso medicinal da cannabis, especialistas e pacientes como Vivian esperam que o país encontre soluções regulatórias que possam tornar essa importante alternativa terapêutica mais acessível e segura para aqueles que dela necessitam.