Guedes pode causar turbulências no mercado após notícia de que ele e Roberto Campos atuaram em paraísos fiscais

 

O mercado ficará atento aos desdobramentos da notícia de que o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do BC (Banco Central), Roberto Campos Neto, mantiveram empresas em paraísos fiscais depois de terem entrado para o governo de Jair Bolsonaro

 

 

A abertura de uma offshore ou de contas no exterior não é ilegal, desde que o saldo mantido lá fora seja declarado à Receita Federal e ao Banco Central. Mas, no caso de servidores públicos, a situação é diferente.

O artigo 5º do Código de Conduta da Alta Administração Federal, instituído em 2000, proíbe funcionários do alto escalão de manter aplicações financeiras, no Brasil ou no exterior, passíveis de ser afetadas por políticas governamentais.

A proibição não se refere a toda e qualquer política oficial, mas àquelas sobre as quais “a autoridade pública tenha informações privilegiadas, em razão do cargo ou função”.

Em janeiro de 2019, cinco anos depois de abrir a offshore e depositar US$ 9,54 milhões, Guedes virou o principal fiador do governo Bolsonaro e assumiu o cargo de ministro da Economia, sob cuja responsabilidade está um enorme leque de decisões capazes de afetar seus próprios investimentos no exterior.

Analistas apreensivos

A avaliação de analistas é de que a notícia pode causar mais turbulência no mercado caso tenha desdobramentos negativos, como um aumento do desgaste político do czar da Economia ou uma investigação por parte dos reguladores. Isso tudo em um momento em que o dólar já passa dos R$ 5,35, informa o Poder 360.

As offshores de Paulo Guedes e Roberto Campos Neto foram reveladas pelo Poder360 neste domingo (3).

Os dados sobre essas empresas são parte do acervo de mais de 11,9 milhões e documentos obtidos pelo ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, na sigla em inglês), uma entidade sem fins lucrativos com base em Washington D.C., nos Estados Unidos.

Poder360 integra essa investigação internacional, chamada Pandora Papers, da qual participaram 615 jornalistas de 149 veículos em 117 países, entre os quais o jornal The Washington Post, a rede britânica BBC, a Radio France, o jornal alemão Die Zeit e a TV japonesa NHK.

Para advogados tributários, o caso pode configurar conflito de interesses. É que Paulo Guedes e Roberto Campos Neto alteraram, por meio de duas resoluções do CMN (Conselho Monetário Nacional), as regras aplicadas ao patrimônio mantido em offshores de brasileiros. A decisão foi publicada em julho de 2020, quando as empresas dos dois estavam ativas.

O presidente do BC dissolveu sua offshore dias depois da decisão do CMN. O ministro da Economia mantém a empresa até hoje e não deixou claro se parou de movimentar a offshore depois de ter entrado no governo. Ambos disseram que as empresas estão declaradas à Receita Federal.

A incerteza sobre os possíveis desdobramentos desta notícia estará no radar dos mercados a partir desta 2ª feira (5.out.2021). Analistas dizem que não há problema em ter uma conta no exterior, desde que os recursos sejam declarados à Receita Federal. Porém, afirmam que é preciso observar os desdobramentos legais e políticos do caso, para saber se houve alguma movimentação ilegal e se isso terá uma repercussão negativa para Guedes e Campos Neto. Havendo um desgaste dos principais nomes da política econômica brasileira, é possível que o caso se transforme em um ruído a mais para o mercado.

“O fato de ter uma offshore não é um problema, o que poderia ser um problema é se a empresa fez alguma operação aproveitando-se de uma informação privilegiada que só se sabia porque era o ministro da Economia ou o presidente do BC. É algo que pode ser investigado. Vamos ver se terá uma investigação”, disse o ex-secretário de comércio exterior e estrategista do banco Ourinvest, Welber Barral.

“Do ponto de vista do mercado, ter uma conta no exterior não é algo negativo e é difícil dizer que houve uma gestão estranha de política econômica por causa disso. No entanto, pode haver uma exploração política do tema e gerar ruído político. Neste caso, será um ruído a mais em um ambiente que já tem sido muito ruidoso. É preciso monitorar os desdobramentos”, falou o economista-chefe do Banco BV, Roberto Padovani.

“Se as empresas estiverem dentro da legalidade, não há problema. Mas sempre haverá alguém para fazer críticas. Por isso, é preciso avaliar as movimentações da empresa e a opinião legal sobre o assunto para avaliar melhor qual será a repercussão disso”, afirmou o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini.